Luz ≃ Matéria

Luz = Matéria

Esta exposição representa o primeiro segmento do projeto Luz = Matéria. Este projeto, que reúne uma seleção de obras pertencentes ao nosso museu, distancia-se da forma convencional com que as coleções são expostas, a reunião de obras por escolas e grupos artísticos através de critérios cronológicos lineares. Contrapondo-se, Luz = Matéria reforça a noção de que o linearismo temporal é apenas mais uma forma de se conceber o tempo e não necessariamente a melhor; que são infinitos os modos de se aproximar obras de arte, tanto quanto de quaisquer objetos, ou até os acontecimentos relevantes dispersos ao longo de nossas vidas. Se fossemos montar a coleção de fatos que marcaram nossas vidas, teríamos que admitir que eles se destacam do comum dos dias que vivemos até aqui, e que nem sempre sabemos o que veio antes e o que veio depois. Pensando nessa direção, um artista de hoje pode sentir-se mais próximo, ficar mais comovido por pinturas de Caravaggio, uma escultura de Rodin ou ainda de uma construção milenar e anônima, do que pelos trabalhos de seus colegas contemporâneos. 

Luz traz trabalhos de artistas que viveram em tempos muitos distintos, produziram obras diversas entre si mas que, não obstante, tinham a luz como denominador comum. Um fascínio que remonta à Da Vinci, que inventou o claro-escuro (chiaro-oscuro): o efeito de sombreamento com o qual garantia a ilusão de volume. Recuando mais ainda, ao nosso ancestral que com um desenho na parede de uma caverna, tornou visível uma cena, um animal. Esse interesse ganhou um novo alento em meados do século XIX, com a chegada dos Impressionistas, para quem era evidente que não pintamos as coisas em si mas a luzes que, depois de incidirem sobre elas, faz com suas formas e cores viagem em direção aos nossos olhos. Na esteira deles vieram os nossos Alfredo Andersen, Guido Viaro, Theodoro de Bona, Alberto da Veiga Guignard, Miguel Bakun, entre tantos outros que compõem nossa coleção e que foram trazidos para essa exposição.

Luz começa, ou termina, por duas obras luminosas, uma pintura abstrata de Tomie Ohtake e a fotografia/colagem de uma paisagem de autoria de Vik Muniz. No centro do espaço expositivo, no interior de uma parede preta de formato  semicircular, centro pulsa a obra de Julio Le Parc, um ambiente onde luzes e sombras se confundem, onde a revelação junta-se ao mistério, e onde o visitante reagirá com encantamento. Entre essas três peças, outras pinturas, fotografias, desenhos, gravuras, esculturas, vão se apresentando ao longo de paredes pretas e brancas, puxadas pelos delicados desenhos de Candido Portinari e Mira Schendel. O primeiro um retrato enxuto, feito por poucas mas incisivas linhas, o segundo, um emaranhado de linhas capilares que não representa outra coisa que não a linha como ponto de partida de tudo, a começar pelo desenhos de cada uma das letras que compõem este texto. 

O sinal de semelhante, não de igual, de Luz = Matéria, inspirado na célebre equação de Einstein (E=mc2), assinala que esses termos não são opostos. Apesar da natureza intangível da luz e da corporeidade mais ou menos enfática da matéria, ambas estão entrelaçadas. Afinal, a luz nasce aos nossos olhos como uma exalação das coisas, uma espécie de aroma, enquanto a matéria que as constitui resplandece dentro da escuridão quando é despertada por ela. Hoje trazemos Luz, em poucos meses seu par, Matéria.

Agnaldo Farias

Curador Geral do MON